Inveja febril
Deito adentrando minhas pernas com cuidado o túnel de cobertas e, sinto, já de longe, o calor febril daquele corpo alongado que se fez dentro de mim há mais de treze anos.
A gata transita curiosa pela casa, arregalando seus olhos esverdeados e, por vezes, vindo até ao meu quarto, miando por atenção enquanto tentamos , minha filha e eu, dormir numa cama destinada a um casal.
Recoloco a toalha molhada em sua testa e, por segundos, tenho inveja de sua febre.
Queria eu ter um calor bem forte, febre mesmo, daquelas brabas, pra ver se delirava mais um pouco e saía de vez desta realidade insana destes dias atuais.
Queria estar com sua febre, não por dó nem piedade pelo corpo doído e quente, mas por mim mesma.
Inveja febril e egoísta mesmo e daí?
Meu corpo fervendo, desta vez de febre, doendo em todos os ossos, e não doendo dores de alma partida.
Febre, dor no corpo, ardor nos olhos e carinho , muito carinho e agrado que, então, só isto bastaria pra sarar uma metade de mim.
A vontade de ter uma toalha fria na testa e um calor dos infernos no corpo é o que me sustenta nesta noite quente de desejos e lua cheia.